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Procurando onde não pode ser encontrado

De saída, aqui fica a questão: “A quem pertenço? A Deus ou ao mundo?”. Muitas das preocupações diárias sugerem que pertenço mais ao mundo do que a Deus. Qualquer crítica me deixa zangado e a menor rejeição me deprime. O menor elogio levanta meu espírito, um pequeno sucesso me anima. Bem pouco é necessário para me levantar ou me deixar por baixo. Frequentemente sou como uma embarcação num oceano, completamente ao sabor de suas ondas. O tempo e energia que consumo tentando manter o equilíbrio e evitando ser abatido e naufragar mostra que minha vida é uma luta pela sobrevivência. Não uma luta abençoada, mas um questionamento preocupado que resulta da idéia errada de que é o mundo que dá os meus parâmetros.

Enquanto eu ficar perguntando: “Você me ama? Você realmente me ama?”, eu confiro todo o poder às vozes do mundo e me coloco em situação de dependência porque o mundo está cheio de “ses”. O mundo diz: “Sim eu o amo se você é bonito, inteligente e rico. Eu amo “você” se você tem boa educação, bom emprego e bons relacionamentos. Amo você se você realiza muito, vende muito, compra muito”. Há “ses” sem número escondidos no amor do mundo. Esses “ses” me escravizam uma vez que é impossível responder adequadamente a todos eles. O amor do mundo é e será sempre condicional. Enquanto eu buscar o meu verdadeiro eu no mundo condicional, ficarei “preso” ao mundo, tentando, caindo e tentando novamente. É um mundo que leva à decadência, porque o que oferece não preenche o anseio mais íntimo do meu coração.

“Decadência” pode ser a melhor palavra para explicar o vazio que tão profundamente permeia a nossa sociedade contemporânea. Nossos hábitos fazem que nos apeguemos àquilo que o mundo chama de realização pessoal: acúmulo de fortuna e poder; obtenção de status e admiração; consumo excessivo de comida e bebida, e satisfação sexual, sem fazer distinção entre concupiscência e amor. Esses hábitos criam expectativas que só podem deixar de satisfazer nossas verdadeiras necessidades. Enquanto cultuamos os valores mundanos, nossos hábitos levam-nos a indagações infrutíferas no “país distante”, fazendo com que nos defrontemos com desilusões sem fim, ao mesmo tempo em que dentro de nós sobra um vazio. Nesses dias em que aumentam as solicitações, peregrinamos longe da casa do Pai. A vida desregrada pode muito bem ser considerada uma vida vivida num “país distante”. É de lá que se origina o nosso clamor por libertação.

Sou o Filho Pródigo toda vez que busco amor incondicional onde não pode ser encontrado. Por que continuo a ignorar o lugar do amor verdadeiro e insisto em buscá-lo em outra parte? Por que volto a sair de casa onde sou chamado um filho de Deus? Um amado de meu Pai? Fico constantemente surpreso, verificando como disponho dos dons recebidos de Deus – minha saúde, qualidades emocionais e intelectuais -; utilizo-os para impressionar as pessoas, receber aprovação e louvor, e competir por recompensa, em vez de desenvolvê-los para a glória de Deus. Sim, muitas vezes carrego-os para um “país distante” e coloco-os a serviço de um mundo oportunista que desconhece seu verdadeiro valor. É quase como se eu quisesse provar a mim mesmo e aos que me rodeiam que eu não necessito do amor de Deus, que posso subsistir por conta própria, que posso ser totalmente independente. Sob tudo isso, há a grande revolta, o “não” decisivo ao amor do Pai, a imprecação não proferida: “Eu gostaria que você estivesse morto”. O “Não” do Filho Pródigo reflete a revolta original de Adão: seu afastamento do Deus em cujo amor somos criados e do qual depende o nosso sustento. É a rebelião que me coloca fora do jardim, longe do alcance da árvore da vida. A insubordinação que faz com que me perca num “país distante”.

A Volta do Filho Pródigo, Henri J. M. Nouwen, Paulinas. Páginas: 47-48

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